Quase 100 anos se passaram desde que foi declarada em Portugal a República.
Quase 100 anos volvidos, impera fazer uma reflexão abrangente sobre o que significa a República como conceito de forma de governo, o que significou ela em Portugal e abordar igualmente as paixões que o debate República vs. Monarquia ainda suscita.
Todo o debate que se faz à volta da questão "República ou Monarquia?" frequentemente desemboca numa série de argumentos inconsequentes que mais não fazem do que arredar da discussão os factos que interessam, de facto, discutir.
Tentar justificar uma opção pró-Monarquia fazendo uma apologia da "estabilidade" desse tipo de governo e uma condenação dos crimes das revoluções republicanas e dos defeitos das novas repúblicas é tão inútil como justificar uma opção pró-República usando o mesmo tipo de argumentos assentes mais em erros pontuais de regime e inerentes a cada caso particular do que em filosofia política concreta.
Estas duas correntes de debate, apesar de exaltarem paixões, nada mais fazem do que se limitarem a sofismar.
Bem se sabe que hoje em dia, pelo menos na sociedade ocidental, já não se fala de monarquia absoluta. Fala-se de monarquia representativa e democrática, como é o caso espanhol, britânico, holandês, belga, luxemburguês, dinamarquês, sueco e norueguês. Nesta altura, o recorrente debate de sofismas que exalta algumas pessoas poderia conduzir logo para o aparecimento de argumentos pró-monárquicos, de que todos estes países são países extremamente desenvolvidos (mais desenvolvidos do que a República Portuguesa) e de argumentos pró-republicanos, de que estes países representam uma minoria e que existem repúblicas (como a francesa e a alemã) que são tão, ou mais desenvolvidas do que os enunciados países monárquicos.
A República, nas suas diversas formas de governo democrático, e é aqui que importa centrar a discussão (e não em repúblicas totalitárias), apresenta um conceito de democracia mais evoluído na questão da posição de Chefe de Estado. De facto, na República, o Chefe de Estado é alguém eleito directamente pelo povo e aberto a qualquer cidadão apto, ao contrário da Monarquia, em que é um órgão não sujeito a eleição e que só pode ser ocupado por alguém que pertença à linhagem de uma determinada família. Neste aspecto, e tão somente neste, se pode falar dum conceito mais evoluído de democracia: não existe um direito natural e pré-adquirido de uma pessoa a um órgão de soberania do Estado.
Vivemos numa República que foi declarada de uma forma atabalhoada e anárquica, com a ignorância da população, e que foi bem sucedida mais por inércia e inaptidão do Estado da altura do que por valor e organização das facções republicanas. Tentar pintar a 1ª República como um regime libertador e democrático é, para qualquer pessoa que conheça o mínimo de história, extremamente ridículo e insultuoso ao próprio conceito de democracia. De facto, tentar dizer que um regime em que se prendia sem mandato, se executavam opositores, onde a justiça era inexistente e na rua reinava (ironia das ironias) o caos e anarquia, é, no mínimo, passar um atestado de estupidez às pessoas ou um exercício de senilidade aguda só ao alcance do Dr. Mário Soares.
Estabelecendo o facto de que Portugal só se tornou uma República democrática depois do 25 de Abril de 1974 (25 de Novembro de 1975, de facto) torna-se um pouco inconsequente, nos dias de hoje, discutir se Portugal deveria ser uma Monarquia ou continuar uma República, baseado no facto de não ter havido uma consulta popular. Quase tão inconsequente como discutir se Portugal deveria ter declarado (sem consulta popular), no 1º de Dezembro de 1640, a sua restauração de independência face a Espanha ou discutir se D.Afonso Henriques deveria ter declarado (sem consulta popular) em 1139 a independência de Portugal face ao Reino de Leão e Castela. Portanto, defender a realização de um referendo sobre se Portugal deverá ser uma Monarquia ou uma República é tão relevante, a nível de justiça histórica, como um referendo sobre se Portugal deverá fazer parte de Espanha ou como um referendo sobre se Portugal deverá ser uma ditadura ou uma democracia. Qualquer decisão que adviesse do referendo seria, de facto, uma decisão democrática, mas nem por isso eticamente aceitável.
A democracia não é um conceito linear e absoluto. Em nome desta não se deve cair na tentação de, permitam-me a expressão, "retroceder" em direitos de maior abrangência democrática. De certa forma, e já tinha abordado isto noutra análise, a democracia pode funcionar numa lógica anti-democrática ao atentar contra ela própria. Exemplo desta permissa seria um referendo à ditadura em que, numa decisão democrática, se acaba com a democracia.
Não querendo, de forma nenhuma, estar a comparar a Monarquia com a ditadura (e só quem não leu bem é que poderá assim interpretar), o que quero dizer é que, tratando-se a República democrática de um conceito mais abrangente da participação democrática e dos direitos dos cidadãos na "coisa pública" (definição de República, Res Publica), um referendo que pretenda limitar (mesmo que de uma forma bastante ténue) esses direitos seria, apesar de veicular uma decisão democrática, um retrocesso factual do conceito democrático existente.
Publicado n'O Centro Social em Janeiro deste ano. Infelizmente, está actual ainda.
No dia 10 de Janeiro do ano 49 AC, há 2059 anos atrás, Júlio César atravessava o rio Rubicão, proferindo as famosas palavras “alea jacta est”, isto é, “os dados estão lançados”.
Desde aí, a expressão “atravessar o Rubicão” adquiriu um significado paradigmático de qualquer situação que chegue a um ponto de não retorno.
Para César, vindo desde os confins da Gália e chegado ao Rubicão, fronteira proibida de passar por qualquer legião do exército romano, sabia que passar esse rio significava guerra, o tal ponto de não retorno. Ou sairia dela como um traidor executado e para sempre esquecido entre os meandros da história ou como o glorioso vencedor e governante absoluto da República que queria tornar Império.
A memória deste evento não é aleatória nesta ocasião.
Portugal, no cantinho ocidental da antiga República e Império Romano, aproxima-se, tal como César e seu exército, do seu Rubicão.
A despesa pública, prevê-se, atingirá valores a rondar os 120% do PIB em apenas dois anos. A economia portuguesa, se nada se fizer de drástico no que toca a redução da despesa, deparar-se-á com problemas gravíssimos de contracção de novos empréstimos a taxas de juro aceitáveis, enfrentará uma situação de eminente falência do sistema de apoio social e de impossibilidade de cumprimento na distribuição das reformas. Com isso, virá o caos social, a revolta das pessoas que, sistematicamente, vêem o Estado reduzir os seus direitos, vêem o Estado a tirar quase 50% do seu salário para o mal gerir, vêem o Estado atribuir menos de reforma a quem trabalhou uma vida inteira do que de alguns subsídios de desemprego ou rendimentos sociais de inserção a quem trabalhou um ano.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, como se chegou a tal ponto crítico.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, como os recursos e os impostos foram tão mal geridos, não compreenderá como é que aqueles que governam, governam mal e enriquecem e eles, que dão, trabalham e pagam, empobrecem e perdem direitos.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, qual o sentido desta democracia afundada em falências das contas públicas e ineficiências macabras de justiça.
Não compreenderá, se nada for feito entretanto, porque razão hão-de dar o melhor, trabalhar mais por um país, por um Estado que, no fim das contas, não responde aos seus deveres.
Portugal marcha, solene e quase inconsciente, em direcção ao Rubicão.
Passará por ele com sucesso, ou condenado à irrelevância?
“Alea jacta est”
"There is a great, basic contradiction in the teachings of Jesus. Jesus was one of the first great teachers to proclaim the basic principle of individualism -- the inviolate sanctity of man's soul, and the salvation of one's soul as one's first concern and highest goal; this means -- one's ego and the integrity of one's ego. But when it came to the next question, a code of ethics to observe for the salvation of one's soul -- (this means: what must one do in actual practice in order to save one's soul?) -- Jesus (or perhaps His interpreters) gave men a code of altruism, that is, a code which told them that in order to save one's soul, one must love or help or live forothers. This means, the subordination of one's soul (or ego) to the wishes, desires or needs of others, which means the subordination of one's soul to the souls of others.
This is a contradiction that cannot be resolved. This is why men have never succeeded in applying Christianity in practice, while they have preached it in theory for two thousand years. The reason of their failure was not men's natural depravity or hypocrisy, which is the superficial (and vicious) explanation usually given. The reason is that a contradiction cannot be made to work. That is why the history of Christianity has been a continuous civil war -- both literally (between sects and nations), and spiritually (within each man's soul)."
- Ayn Rand, Letters of Ayn Rand, p. 287
Em toda a filosofia objectivista, erradamente (a meu ver) se confronta individualismo vs. altruísmo e, de forma pouco inocente, se faz a ponte para a equiparação deste confronto como o de sendo individualismo vs. colectivismo.
Precisamos de separar conceitos. Se se pode falar de individualismo vs. colectivismo, quando se quer confrontar o altruísmo, tem de se falar do egoísmo, e não do individualismo.
Toda esta questão corre sempre o perigo de cair numa mera discussão de semântica, dado que, em linguagem corrente, é bastante comum tratar-se individualismo e egoísmo como quase sinónimos. Mas se queremos falar de uma forma clara, filosoficamente clara, é necessário separar os conceitos e tratar as coisas pelos nomes.
De facto, está errado colocar-se o pensamento cristão, nesta contenda entre individualismo vs. colectivismo, do lado do colectivismo. Da mesma maneira está errado colocar-se, sem reservas, o pensamento cristão do lado do individualismo. Ele não é, totalmente, nem um nem outro. Teríamos de explorar um terceiro vértice (que já não é matéria para este post): o personalismo.
Para um cristão, o altruísmo é uma questão ética, uma virtude moral. Se acha que compete, ou não, ao Estado o garante de mínimos (por forma contributiva de todos) a certos sectores da sociedade, isso já seria uma discussão de liberalismo. Um liberal pode ser cristão (ou muçulmano, ou hindu), considerando o altruísmo uma virtude moral, mas defendendo que não compete ao Estado exercer por "coerção" essa virtude, defendendo que compete ao indivíduo a decisão de contribuir, ou não, para o alívio das necessidades de outros.
O que não se pode ignorar é que existe, de facto, uma contradição entre objectivismo e cristianismo ou, pelo menos, uma incompreensão parcial do que é (realmente) o cristianismo, por parte do objectivismo.
Da análise da filosofia objectivista, salta à vista a forma categórica com que aborda toda a questão do código de ética comportamental humana: o altruísmo é considerado contra-natura, exalta-se o individualismo (egoísmo, para se ser mais correcto) como único garante da felicidade. Ocorre sempre, desta análise, a interrogação do que aconteceria, em termos hipotéticos, a uma sociedade se todos os seus indivíduos fossem, de facto, objectivistas. Seria o fim da sociedade? Será por isso que, como alguns dizem, pela determinação comum do desenhar um Homem Novo e da quebra das fundações judaico-cristãs do pensamento ocidental, o objectivismo é tão utópico como o socialismo?
Bom, mas para interrogações filosóficas parece que os pontos abordados já são dose suficiente.
O que ainda não se percebeu em Portugal é que aumentar impostos não resolve coisa nenhuma.
Se resolvesse, com estes 35 anos de consecutivos aumentos de impostos, todos os nossos problemas teriam sido resolvidos, e não o foram.
Mas o problema não é, por si, o subir impostos. Tal até poderia ser bom como uma medida extraordinária, temporária face às pressões que os mercados estão a sofrer de momento. O problema é que, neste país, facilmente se sobe impostos e quase nunca se desce (excepto o IVA, com flutuações de 1%), estando-se a vender uma medida supostamente "extraordinária" que, na verdade, passará a regra futura pois muito dificilmente o Estado abdicará deste aumento de receita. Tal nos prova a história destes últimos 35 anos.
Se aumentar impostos nos permite acelerar a consolidação orçamental que se requer? Sim.
Se essa consolidação orçamental também poderia ser atingida com um real esforço de corte de despesas (acabe-se com os RSI, por exemplo) e sem recurso a aumento de impostos? Sim.
Se as medidas apresentadas hoje pelo Governo vão fazer recuperar a economia? Não.
E não o vão porque, muito simplesmente, consolidação orçamental não significa crescimento da economia.
Se, por um lado, aumento de impostos significa mais receita para combater défices, por outro lado significa um encolhimento do consumo e um desincentivo do trabalho que, completando o ciclo, afecta a produtividade e, asfixiando (ainda mais) a economia real, condena o país à estagnação (aos "crescimentos" de 0,5 ou 1% que temos andado a crescer há quase 20 anos) que, obviamente, apenas contribui para se manter os défices produtivos.
Portanto, não nos iludamos. Na melhor das hipóteses, todas estas medidas urgentes e "extraordinárias" apenas servirão para nos tirar o nariz e a boca fora da água para apenas ficarmos com ela pelo pescoço.
São as medidas de sempre que nos condenam à mediocridade.
São as medidas de sempre que nos condenam a défices, se tudo correr "bem", na ordem dos 3%.
São as medidas de sempre que nos condenam a "crescimentos", se tudo correr "bem", na ordem dos 1%.
E correndo "bem", lá nos regozijamos todos por estas pequenas vitórias morais... De vitória em vitória até à derrota final.
Ainda não se percebeu que o problema é estrutural.
Ainda não se percebeu que o problema é o paradigma.
Ainda não se percebeu o óbvio.
Quando um BCP apresenta um aumento de lucros na ordem dos 12% para 225 milhões de euros em 2009 e recusa bónus aos trabalhadores com a justificação de ter tido um "ROE" baixo (rentabilidade de capitais próprios), quando este aumentou, só contribui para a desconfiança e descontentamento já existentes na sociedade em relação aos bancos.
Há que ter ética no trabalho. Não faz sentido numa empresa que apresenta lucros enormes, dividirem-se os lucros unicamente entre os accionistas e administradores e deixar os trabalhadores de fora.
É um princípio de justiça, de boas prácticas, recompensar os trabalhadores quando uma empresa tem um bom desempenho. Não o fazer é desvalorizar os mesmos, não o fazer é desvalorizar o trabalho, não o fazer é contribuir para clivagens entre trabalhadores e direcções e minar a harmonia numa empresa.
No caso particular dos bancos, a situação é, ainda mais, incompreensível e injusta.
No meio da enorme crise que se passou e ainda dura, os bancos obtiveram lucros inimagináveis. Além disto, os trabalhadores bancários são dos mais explorados a nível de horas de trabalho, sendo prova disso as multas recorrentes que os bancos pagam à Autoridade do Trabalho por não pagarem horas extraordinárias aos seus trabalhadores.
Face a isto, de facto não compreendo como é que o maior banco privado português se pode dar ao luxo de justificar algo injustificável, ainda por cima com uma falácia. É uma falta de ética, de valores, de responsabilidade e de justiça que, infelizmente, o BCP já vem habituando os portugueses através de demasiados casos.
Numa altura em que temos em solo português um ilustre escolástico de nome Joseph Ratzinger, cuja obra acerca de ética é de um valor inestimável, e que essa mesma ética - como princípio imperativo a toda a acção humana (na vida, no trabalho, na política) - tem andado na ordem do dia, convém, já agora, pensarmos nisto.
No seguimento dum post do André Lucas, importa-me abordar alguns aspectos interessantes.
O André levanta uma boa questão, penso é que a aborda pelo lado errado.
Para mim, a questão não tem que ver com "contribuintes a pagar o erro de outros", como o André aponta.
Como sabemos, o SNS é abrangente: eu posso andar de olhos vendados pela rua, cair numa valeta, ir para o hospital e o SNS cobre-me uma grande parte das despesas.
Se acrescentar a isto o facto da minha mãe ser funcionária pública e de eu, dessa forma, ainda beneficiar de ADSE, então praticamente não pagaria nada. Fui irresponsável, e quem pagou, basicamente, foram todos os contribuintes.
Se a questão da irresponsabilidade e do erro não se coloca noutras situações, nesta não me parece que deva ser diferente.
A questão interessa ser pegada, mas por outro lado.
O que interessa de facto discutir é a ilusão e a mentira descarada que os promotores do "SIM" no Referendo lançaram à opinião pública.
De facto, da parte do SIM, quiseram fazer crer que esta era a única hipótese: o aborto sem reservas, quem quer aborta e ninguém controla, ninguém informa, ninguém sensibiliza, ninguém educa.
Porquê? Porque, segundo os arautos do "SIM", as mulheres são todas pessoas de bem, informadas e sensíveis que apenas recorreriam ao aborto por extrema necessidade, por imperativo superior.
Pouco importou que da parte do "NÃO" se encontrassem pessoas que, sendo favoráveis à despenalização do aborto, não se reviam numa postura de total liberalização e desresponsabilização, em suma, não se reviam num convite claro de tornar o aborto num mero e recorrente método contraceptivo.
O facto é que, segundo estudo feito na Maternidade Alfredo da Costa (a maior do país e que reflecte a tendência nacional), 87% das mulheres que abortam não usam contraceptivos.
O facto é que, a maioria das mulheres que foram abortar à Maternidade Alfredo da Costa "não fazia planeamento familiar e mesmo depois do aborto algumas optaram por continuar a não fazer nenhum método contraceptivo"
Onde está o choque das pessoas? Onde estão as coberturas das televisões e as manchetes dos jornais? Onde está o reconhecimento das pessoas que promoveram o "SIM" de que o modelo que preconizavam estava errado e que promove o aborto como contracepção?
Sendo Portugal um país com uma grave crise demográfica, é de espantar que as políticas de natalidade não comecem, precisamente, por uma grande restrição e controlo das prácticas abortivas. Mas Portugal, infelizmente, habituou-nos a espantar pelas piores razões.
As questões financeiras associadas ao aborto, a meu ver, são secundárias ou mesmo inúteis.
A questão é mesmo de princípio:
Concorda com a liberalização total do aborto, se realizado, por opção da mulher, nos primeiros dois meses e meio, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado, com total comparticipação pelo Estado e com direito a subsídio de gravidez?
Mas ninguém faz esta pergunta.
Ninguém a quis fazer em 2007, porque talvez aí se arriscassem a que o "NÃO" fosse bem superior aos 40,75%. Desta forma, a pergunta a referendo, «Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?», ficou provada que mais não foi do que um engodo.
Mais, o que importa saber é se, depois destes factos todos, o leitor é a favor ou contra a lei actual do aborto.
Nos últimos dias tem-se assistido a uma hipotética "crise" governativa causada, ao que parece, pela Lei das Finanças Regionais.
O Governo PS, na sua extrema dramatização da questão, vem dizer que numa altura de contenção e de controlo de endividamento externo, permitir à Madeira subir o seu limite de endividamento seria um mau sinal para o mercado e para os organismos que observam Portugal: UE e agências de rating.
Ora bem, admitamos que a permissa é verdadeira. Que a razão deste "finca-pé" é, de facto, uma questão de princípio. Nesse caso, não seria expectável que, em nome da coerência de princípio, este mesmo Governo se esforçasse por conter a despesa e o endividamento noutras situações que agravam, exponencialmente mais, essa mesma despesa e endividamento externo?
Não seria expectável que, em nome da coerência da permissa que o Governo apresenta, se no continente se defende que se deve aumentar o endividamento (com TGV, Aeroporto, nova ponte sobre o Tejo e novas estradas) por este permitir um investimento imediato que, supostamente, reanimará o emprego e os índices económicos, a mesma premissa fosse defendida para as regiões autónomas?
Não falemos sequer da pseudo-credibilidade que um Governo como o nosso tem para falar do "despesismo" da Madeira. Será por acaso o Estado Português e os Governos que o lideraram nestes últimos 35 anos algum exemplo de boa gestão?
Portanto, ficando estabelecido que este irredutível princípio do Governo é incoerente com a sua linha geral de governação, importa descobrir então que motivação (porque a há sempre na política) estará oculta nesta linha estratégia radicalizada na ameaça de demissões e na insolência da promessa de não cumprir o deliberado pela Assembleia da República, órgão soberano representante do povo.
Temos duas hipóteses.
1 - Esta estratégia visa forçar um confronto radicalizado que pareça legitimar uma demissão do Governo por incapacidade governativa, um "abandonar o barco" e deixar o "pântano governativo" para outros. Algo que o PS já fez, pela mão de Guterres, com Sócrates a ministro - "Old habits die hard".
2- Esta estratégia visa forçar um confronto radicalizado que pareça legitimar uma demissão do Governo que, alegando impossibilidade de governar, peça maioria absoluta (terreno favorito) ao eleitorado, aproveitando de uma assentada a indecisão actual no PSD com a fuga ao desgaste que as próximas presidenciais farão a Sócrates onde, quer Cavaco, quer Alegre não lhe darão "palmadinhas nas costas".
Será lícito especular que o Governo liderado por José Sócrates fosse capaz de tal atitude aviltante?
Bom, para fazermos esta pergunta teríamos igualmente de nos questionar se este mesmo Governo e se este mesmo Primeiro Ministro seriam capazes de, por exemplo, mentir sobre o défice em época de eleições para, logo depois das eleições apresentar o seu verdadeiro valor.
Teríamos de nos questionar se seriam capazes de, por exemplo, engendrar desaparecimentos de programas e de jornalistas que sigam uma linha de crítica ao Governo.
Teríamos de nos questionar se seriam capazes de aceitar subornos para licenciar obras ignorando impactes ambientais.
Teríamos de nos questionar se seriam capazes de assinar projectos da autoria de outros técnicos.
Teríamos de nos questionar se seriam capazes de participar em processos ilegais de obtenção de habilitações académicas.
Teríamos de nos questionar se seriam capazes de mentir sobre as suas habilitações académicas.
Teríamos, enfim, de nos questionar se seriam capazes de alterar as leis do código de processo penal apenas para estas encaixarem que nem uma luva no processo "Casa Pia".
Teríamos de nos questionar, portanto, sobre muita coisa.
Ora, questionar é algo que o povo português, actualmente, parece não gostar muito.
Mais grave que isso, questionar é algo que o Governo, actualmente, parece não gostar muito.
Notícias como esta ainda me suscitam alguma perplexidade:
"Uma cadeia só para pessoas transgénero
Portanto, deixem ver se eu percebi:
Discriminar trangéneros e gays no casamento: mau.
Discriminar transgéneros e gays no exército: mau.
Discriminar transgéneros na prisão: bom.
Agora estou confuso.
Se se faz uma prisão para transgéneros, porque não uma para gays? Porque não uma para todas as pessoas com deformações passíveis de serem escarnecidas por outros reclusos?
E essa discriminação? É boa ou má?
Bolas, agora estou mais confuso.
[Publicado inicialmente aqui]
O título parece assumir um poder, uma força merecedora da maior eloquência filosófica na abordagem à problemática. Aviso que defraudarei expectativas. Limitar-me-ei a constatar essa evidência categoricamente afirmada no título do post.
O facto, a evidência que habita, em surdina, o senso comum do mais comum dos cidadãos, é que as palavras “verdade” e “política” são antónimos. E porquê? Porque razão a política não se parece coadunar com a verdade, no entender dos cidadãos? A resposta é simples. Os políticos, pelas acções, pelos discursos, têm defraudado constantemente as expectativas da população. A “verdade” política serve uma agenda, é normalmente um engodo, um sofisma. Escondem-se os factos que rebatem determinada “verdade”, os partidos isolam-se em si próprios ao invés de dialogarem, honestamente, um projecto para o país, e cai-se nesse ciclo que é o “jogo” da política. A gravidade da situação, por se tornar senso comum que “eles não fazem nada” e que “são todos iguais”, é que esta ameaça caminhar numa direcção explosiva – uma total descrença no sistema democrático (já bem patente nos níveis de abstenção). Cabe à sociedade civil consciente e informada, mobilizar-se e pressionar por mudança. Está visto que os movimentos de cidadãos não resultaram. A mudança passará, portanto, pelos partidos políticos. Enquanto a sociedade civil capaz e dinamizadora, ainda a maioria silenciosa, não se aperceber que a solução está em aproximar-se dos partidos para os mudar e não em afastar-se e deixá-los decair nos seus vícios, esta situação de divórcio entre cidadãos e política dificilmente será invertida. Nunca haverão demasiados pessoas de Bem na política. A virtude está com o cidadão altruísta que faz da política, efectivamente, uma práctica para o bem comum.
A minha opinião, sem tirar nem pôr, acerca do casamento entre pessoas do mesmo sexo, nas palavras de Lobo Xavier e, sim é possível, de Pacheco Pereira.
Prestar atenção a partir do minuto 40.
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