Outrora tivemos um mundo dividido por um muro ideológico que servia como garante das identidades e dos valores defendidos por cada lado da cortina de ferro. O Muro de Berlim caiu e com ele, faliu o modo de vida comunista imposto aos povos do outro lado. Os interesses dos protagonistas eram cobertos pela capa das ideologias e do bem-estar económico-social inerente a cada uma delas e, apesar das ameaças, o Ocidente vivia um sentimento de confiança historicamente incomparável. Durante algum tempo ainda se pensou que o modelo democrático ocidental iria prosperar, servindo de exemplo a uma quantidade de povos que durante longo tempo ansiaram pela liberdade. Contudo, o que se verificou foi que, na Europa, as comunidades religioso-culturais aumentaram e no mundo, outros fenómenos emergiram, motivados por interesses abafados e controlados por uma estabilidade mantida durante quarenta anos. Num mundo mais globalizado e marcado por um vazio geopolítico, foi necessário encontrar outra cobertura para a justificação desses interesses. E essa cobertura foi a religião, com Deus a regressar ao campo de batalha e, assim, o modo de vida ocidental a estar novamente sob premanente ameaça.
Facilmente infiltrável por outros modos de vida e culturas, a democracia ocidental foi obrigada a arranjar novos meios para se defender. O espaço de liberdade imperante nos países democraticos passou a ser utilizado por interesses mal intencionados de vingança e de ódio para fomentar o radicalismo e o fundamentalismo, nomeadamente de cariz islâmica, com expressão máxima nos atentados terroristas de 11/9, 11/3 e 7/7. Para se defender, a democracia passou a dar mais importância à segurança, embora no momento a seguir, surgissem críticos e a opinião pública em defesa da liberdade, gerando um dilema de desconfiança por parte dos cidadãos em relação aos poderes públicos que actuam em sua defesa.
Por outro lado, a campanha de homogeneização promovida pelos governos europeus, curiosamente, em nome da liberdade não só tem contribuído para exponenciar a crise de valores e de identidade já sentida, mas também para fomentar revoltas por parte das comunidades acolhidas. Parece que professar a religião na Europa se tornou condenável. São abolidos crucifixos em espaços públicos, é proibida a construção de minaretes, são impostas regras ao vestuário. Em nome da igualdade, prejudica-se a liberdade de expressão e a liberdade religiosa. Em nome da igualdade tentam-se apagar as heranças culturais e civilizacionais europeias para não causar insatisfação a outras comunidades que, voluntariamente, escolhem a democracia motivadas pela crença de se poderem expressar livremente.
Pretendo com esta reflexão meramente transmitir que, está na altura de repensar toda a campanha de laicidade e de anti-religiosidade promovida na Europa. Sendo o mundo ocidental um conjunto de democracias livres, o dever de qualquer governo neste círculo é o de promover a liberdade religiosa, a tolerância e o diálogo intercultural, sem perder acima de tudo as suas raízes culturais e tradicionalmente judaico-cristãs. Actuar inversamente é minar a democracia e contribuir para o incremento da crise identitária em que o ocidente vive, fomentar a intolerância, impossibilitar o diálogo e convidar a radicalismos. Pois não é por acaso que as comunidades muçulmanas na Europa são mais perigosas e radicais do que as comunidades muçulmanas nos Estados Unidos.
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