Sábado, 15 de Maio de 2010

Objectivismo vs. Cristianismo


"There is a great, basic contradiction in the teachings of Jesus. Jesus was one of the first great teachers to proclaim the basic principle of individualism -- the inviolate sanctity of man's soul, and the salvation of one's soul as one's first concern and highest goal; this means -- one's ego and the integrity of one's ego. But when it came to the next question, a code of ethics to observe for the salvation of one's soul -- (this means: what must one do in actual practice in order to save one's soul?) -- Jesus (or perhaps His interpreters) gave men a code of altruism, that is, a code which told them that in order to save one's soul, one must love or help or live forothers. This means, the subordination of one's soul (or ego) to the wishes, desires or needs of others, which means the subordination of one's soul to the souls of others.

 

This is a contradiction that cannot be resolved. This is why men have never succeeded in applying Christianity in practice, while they have preached it in theory for two thousand years. The reason of their failure was not men's natural depravity or hypocrisy, which is the superficial (and vicious) explanation usually given. The reason is that a contradiction cannot be made to work. That is why the history of Christianity has been a continuous civil war -- both literally (between sects and nations), and spiritually (within each man's soul)."

 

- Ayn Rand, Letters of Ayn Rand, p. 287

 

Em toda a filosofia objectivista, erradamente (a meu ver) se confronta individualismo vs. altruísmo e, de forma pouco inocente, se faz a ponte para a equiparação deste confronto como o de sendo individualismo vs. colectivismo.

Precisamos de separar conceitos. Se se pode falar de individualismo vs. colectivismo, quando se quer confrontar o altruísmo, tem de se falar do egoísmo, e não do individualismo.

 

Toda esta questão corre sempre o perigo de cair numa mera discussão de semântica, dado que, em linguagem corrente, é bastante comum tratar-se individualismo e egoísmo como quase sinónimos. Mas se queremos falar de uma forma clara, filosoficamente clara, é necessário separar os conceitos e tratar as coisas pelos nomes.

 

De facto, está errado colocar-se o pensamento cristão, nesta contenda entre individualismo vs. colectivismo, do lado do colectivismo. Da mesma maneira está errado colocar-se, sem reservas, o pensamento cristão do lado do individualismo. Ele não é, totalmente, nem um nem outro. Teríamos de explorar um terceiro vértice (que já não é matéria para este post): o personalismo.

 

Para um cristão, o altruísmo é uma questão ética, uma virtude moral. Se acha que compete, ou não, ao Estado o garante de mínimos (por forma contributiva de todos) a certos sectores da sociedade, isso já seria uma discussão de liberalismo. Um liberal pode ser cristão (ou muçulmano, ou hindu), considerando o altruísmo uma virtude moral, mas defendendo que não compete ao Estado exercer por "coerção" essa virtude, defendendo que compete ao indivíduo a decisão de contribuir, ou não, para o alívio das necessidades de outros.

 

O que não se pode ignorar é que existe, de facto, uma contradição entre objectivismocristianismo ou, pelo menos, uma incompreensão parcial do que é (realmente) o cristianismo, por parte do objectivismo.

 

Da análise da filosofia objectivista, salta à vista a forma categórica com que aborda toda a questão do código de ética comportamental humana: o altruísmo é considerado contra-natura, exalta-se o individualismo (egoísmo, para se ser mais correcto) como único garante da felicidade. Ocorre sempre, desta análise, a interrogação do que aconteceria, em termos hipotéticos, a uma sociedade se todos os seus indivíduos fossem, de facto, objectivistas. Seria o fim da sociedade? Será por isso que, como alguns dizem, pela determinação comum do desenhar um Homem Novo e da quebra das fundações judaico-cristãs do pensamento ocidental, o objectivismo é tão utópico como o socialismo?

 

Bom, mas para interrogações filosóficas parece que os pontos abordados já são dose suficiente.

publicado por Luís Pedro Mateus às 20:08
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Sábado, 5 de Dezembro de 2009

Democracia-Cristã, Socialismo e Objectivismo

Alguns liberais, não todos, gostam de pintar a Democracia Cristã (DC) como um socialismo light… Não percebo porquê, mas talvez seja por alguns acharem que o liberalismo é a única inspiração possível para a direita democrática.

Esta crença é facilmente desmistificada tomando, como exemplo, o caso alemão, sueco ou holandês (para não alongar muito a lista).

 

Achar que a DC se limita às encíclicas “Populorum Progressio” e “Rerum Novarum” é bastante redutor. Assim como é redutor achar-se que se tem de ser crente para se ser democrata-cristão.

Não existe incoerência nenhuma. A DC defende o Estado laico, logo, não se vislumbra qualquer obrigatoriedade de se ser crente para se ser democrata-cristão.  Alguém que acredite nos 10 mandamentos terá que, obrigatoriamente, ser crente no deus dos judeus e cristãos?

 

Quando se fala de socialismo e democracia-cristã, comparando as duas, é impossível não apontar que desde o início o socialismo foi anti-capitalista (agora não o será, nomeadamente o intitulado de “socialismo democrático” ou “social-democracia”), equanto que a democracia-cristã nunca o foi.

A DC tem, isso sim, uma visão reformuladora do capitalismo, mas isso não é ser contra, tão somente é ser construtivo. É ser a favor de um aperfeiçoamento, de uma evolução que, na visão democrata-cristã, passa por uma consciencialização de imperativos éticos cristãos aplicados à vida e aos negócios.

 

O liberalismo moderno assenta, em grande parte, no Objectivismo de Ayn Rand que, de certa forma, colidem com alguns pressupostos éticos cristãos.

O problema ético do Objectivismo de Rand assenta no facto de esta ignorar completamente a nobreza ética que constitui a acção de um homem que vise o bem comum dos seus pares e não apenas o seu bem individual. Limita-se a chamar-lhe “altruísmo”, classifica-a como “fraqueza”.

A DC não partilha dessa visão. Acredita num Homem que tenha consciências sociais. O Homem não cria apenas para o seu benefício. Cria também em benefício dos outros, exemplos não faltam durante a História. O Objectivismo de Rand, sendo uma inspiração interessante no que toca a produtividade das sociedades, ignora esse facto.

 

Rand ridiculariza toda a acção “altruísta” por achar que este tipo de acção é contra-natura, é contra o próprio interesse individual. Critica a sociedade que valoriza actos altruístas, intitula-os de uma barbárie de sacrifício individual.

Rand acha que o Homem tem de funcionar sozinho, com a sua mente como única arma e funcionando num sistema de troca justa. Pois acontece que, infelizmente, existem pessoas que nada têm para oferecer para poderem receber algo em troca.

Defender um Estado como pessoa de bem que ajude a aliviar a pobreza não é ser-se socialista. A DC não o é e defende-o pelo menos. O importante é perceber que existe uma diferença entre um altruísmo para "ajudar a levantar" e um altruísmo que cria dependência e sustenta a pobreza.  A DC vê a compaixão como um bem, mas em Rand não existe o enaltecimento da compaixão, existe o enaltecer do “egoísmo” e por isso, pelos parâmetros democratas-cristãos, existe essa falha moral/ética.
 

 

“Altruism permits no concept of a self-respecting, self-supporting man—a man who supports his own life by his own effort and neither sacrifices himself nor others … it permits no concept of benevolent co-existence among men … it permits no concept of justice”

- Aynd Rand, “Virtue of Selfishness”

Talvez a grande problemática é que Rand e os Objectivistas decidem dar às palavras “egoísmo” e “altruísmo” um significado mais produndo de filosofia de vida. Todos nós somos egoístas em algumas coisas e altruístas noutras. Por isso, não se vê grande interesse (para além de meramente académico) em estar a dar novas definições a essas palavras.

 

A grande questão, que é mais "palpável" a nível político, é a do papel do Estado. Se o Socialismo acredita na pureza do Estado omnipresente, o Liberalismo acredita na pureza do indivíduo e, em teses mais radicais, no fim do Estado. A história já provou que a Sociedade sofre quer com o Estado sufucante e dominador, quer com o Estado não regulador que acredita cegamente na ética de cada indivíduo.

Por isso a Democracia-Cristã acredita no meio termo.
Acreditar que só o Estado sabe gerir é utopia.
Acreditar que os indivíduos, sozinhos e sem regras, gerem bem, é outra utopia.

Aqueles liberais que se recusam a admitir as falências e as falhas dos modelos económicos extremamente liberais de alguns países e continuam a advogar, dogmaticamente, a pureza do mercado livre e desregulado, assemelham-se aos Comunistas que também recusaram (e ainda recusam) perceber a falência do modelo que preconizavam.

Algumas coisas não são preto ou branco, têm intermédios e o centro-direita é um espaço grande que aguenta bem com convivências, saudáveis até, entre democratas-cristãos e liberais (que resultam bem noutros países) que, visto bem as coisas, inspiram-se e "controlam-se" positivamente. 

 

O Homem não é bom por natureza. A Democracia não é perfeita.

A esperança reside em que haja um Estado de Bem, composto, logicamente, por Homens de Bem, que equilibre a balança entre altruísmo e egoísmo sem interpretações utópicas e dogmáticas de socialismos e liberalismos.

publicado por Luís Pedro Mateus às 19:44
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