Publicado n'O Centro Social em Janeiro deste ano. Infelizmente, está actual ainda.
No dia 10 de Janeiro do ano 49 AC, há 2059 anos atrás, Júlio César atravessava o rio Rubicão, proferindo as famosas palavras “alea jacta est”, isto é, “os dados estão lançados”.
Desde aí, a expressão “atravessar o Rubicão” adquiriu um significado paradigmático de qualquer situação que chegue a um ponto de não retorno.
Para César, vindo desde os confins da Gália e chegado ao Rubicão, fronteira proibida de passar por qualquer legião do exército romano, sabia que passar esse rio significava guerra, o tal ponto de não retorno. Ou sairia dela como um traidor executado e para sempre esquecido entre os meandros da história ou como o glorioso vencedor e governante absoluto da República que queria tornar Império.
A memória deste evento não é aleatória nesta ocasião.
Portugal, no cantinho ocidental da antiga República e Império Romano, aproxima-se, tal como César e seu exército, do seu Rubicão.
A despesa pública, prevê-se, atingirá valores a rondar os 120% do PIB em apenas dois anos. A economia portuguesa, se nada se fizer de drástico no que toca a redução da despesa, deparar-se-á com problemas gravíssimos de contracção de novos empréstimos a taxas de juro aceitáveis, enfrentará uma situação de eminente falência do sistema de apoio social e de impossibilidade de cumprimento na distribuição das reformas. Com isso, virá o caos social, a revolta das pessoas que, sistematicamente, vêem o Estado reduzir os seus direitos, vêem o Estado a tirar quase 50% do seu salário para o mal gerir, vêem o Estado atribuir menos de reforma a quem trabalhou uma vida inteira do que de alguns subsídios de desemprego ou rendimentos sociais de inserção a quem trabalhou um ano.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, como se chegou a tal ponto crítico.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, como os recursos e os impostos foram tão mal geridos, não compreenderá como é que aqueles que governam, governam mal e enriquecem e eles, que dão, trabalham e pagam, empobrecem e perdem direitos.
A população não compreenderá, se nada for feito entretanto, qual o sentido desta democracia afundada em falências das contas públicas e ineficiências macabras de justiça.
Não compreenderá, se nada for feito entretanto, porque razão hão-de dar o melhor, trabalhar mais por um país, por um Estado que, no fim das contas, não responde aos seus deveres.
Portugal marcha, solene e quase inconsciente, em direcção ao Rubicão.
Passará por ele com sucesso, ou condenado à irrelevância?
“Alea jacta est”
Portugal comemora hoje mais uma data em nome da liberdade. Após 60 anos de ocupação e submissão a Castela, os Portugueses decidiram a 1 de Dezembro de 1640, unir-se e recuperar aquilo que são os elementos mais definidores de um Estado - a soberania e a independência. Tratou-se de um acto de coragem e bravura que permitiu a restauração da Monarquia e com isso, a dignidade de todos aqueles que manifestavam saudade pela nacionalidade.
Tal como hoje, embora de forma mais agravada, os Portugueses sofriam de uma justificada falta de credibilidade relativamente ao poder político. Com a Dinastia Filipina, Portugal rapidamente adquiriu o estatuto de província espanhola, foi perdendo domínios imperiais no Oriente, África ou Brasil e foi conduzido a um enfraquecimento que culminou na perda de um lugar cimeiro que ocupava enquanto potência ultramarina. Foi necessário uma actuação revoltosa para devolver a esperança aos Portugueses. É neste sentido, que também nós, inspirados pelos acontecimentos da «manhã pura e alegre», vimos actuar proporcionando um espaço de ideias e debate, onde publicaremos as nossas esperanças, as nossas revoltas e as nossas lutas.
Actuamos no contexto da actual crise económica, política e social, em que a credibilidade e a esperança dos portugueses face aos responsáveis pela governabilidade voltam a ser afectadas. A crise que se vive na actualidade, manifesta-se ao nível das mais altas e poderosas instituições da Nação, que por sua vez despertam um preocupante sentimento de desconfiança por parte dos cidadãos em relação àqueles que são os responsáveis pelo seu bem-estar económico e social. A falta de transparência, a corrupção, a criminalidade ou as injustiças sociais demonstram a clara falta de valores e fazem resurgir apelos à ética nos vários domínios da vida nacional.
Parece que o sentimento de indignação tem vindo a crescer. Será necessário algo semelhante a uma revolução para voltar a dar confiança aos Portugueses? Talvez possamos começar por levar a cabo uma restauração dos princípios e dos valores da ética e da moral...
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